A Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA, na sigla em inglês) é uma organização intergovernamental fundada em 1998, com o objetivo de promover a educação, a pesquisa e a memória do Holocausto, além de combater o antissemitismo globalmente.
A IHRA reúne 35 países-membros e diversos observadores, incluindo, até recentemente, o Brasil, que aderiu como observador em 2021.
Um dos pilares da organização é sua definição de antissemitismo, adotada por mais de 45 países e 2.000 instituições, que serve como ferramenta para identificar e enfrentar o ódio contra judeus, sem força jurídica vinculante, mas com forte impacto simbólico e educativo.
A IHRA representa um compromisso global com a preservação da verdade histórica e a luta contra a intolerância, especialmente em um mundo onde a distorção do Holocausto e o preconceito contra judeus persistem.
A importância da participação
A participação na IHRA é fundamental para nações que valorizam a memória histórica e o combate ao ódio.
Para o Brasil, lar da segunda maior comunidade judaica da América Latina, integrar a aliança significa reafirmar seu compromisso com a tolerância e a educação sobre o Holocausto, honrando figuras como Aracy de Carvalho Guimarães Rosa e Luiz Martins de Souza Dantas, reconhecidos pelo Yad Vashem por salvarem judeus durante a Segunda Guerra Mundial.
Estar na IHRA reforça a posição do Brasil como mediador equilibrado no cenário internacional, promovendo uma cultura de paz e rejeitando qualquer forma de discriminação, especialmente em tempos de aumento global do antissemitismo.
Críticas ao governo de Israel e a incoerência brasileira
É legítimo que o governo brasileiro critique a conduta de Israel no conflito em Gaza, especialmente diante das denúncias de violações humanitárias.
No entanto, o governo brasileiro erra ao adotar uma postura seletiva, condenando Israel com veemência enquanto silencia sobre ações igualmente graves, como a invasão russa da Ucrânia, que causou milhares de mortes e deslocamentos.
Essa inconsistência abre espaço para acusações de parcialidade e, pior, para a instrumentalização do antissemitismo.
A saída da IHRA, anunciada em 24 de julho de 2025, pelo Ministério das Relações Exteriores de Israel e confirmada pelo Itamaraty, coincide com a adesão do Brasil à ação da África do Sul na Corte Internacional de Justiça (CIJ), acusando Israel de genocídio.
Tal movimento sugere um alinhamento político com o chamado “bloco do Sul”, mais do que uma defesa imparcial da justiça.
O crescimento do antissemitismo no Brasil e no mundo.
O antissemitismo tem crescido de forma alarmante. No Brasil, segundo a Confederação Israelita do Brasil (Conib), os casos de antissemitismo aumentaram mais de 200% nos últimos anos, impulsionados por narrativas que confundem críticas ao governo de Israel com ódio aos judeus. Globalmente, a Liga Anti-Difamação (ADL) relatou um aumento de 140% em incidentes antissemitas nos Estados Unidos em 2023, enquanto na Europa, a Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA) registrou um crescimento de 60% em ataques contra judeus entre 2020 e 2024.
A definição de antissemitismo da IHRA, apesar de controversa por alguns que alegam que ela pode limitar críticas legítimas a Israel, é crucial para diferenciar discurso de ódio de críticas políticas, evitando que narrativas antissemitas se disfarcem de ativismo.
A saída da IHRA e a negação de princípios universais.
Sair da IHRA é um gesto comparável a negar a gravidade do apartheid ou outras atrocidades históricas.
Assim como o apartheid sul-africano foi um crime contra a humanidade que exigiu repúdio global, o Holocausto demanda um compromisso contínuo para que sua memória não seja distorcida ou instrumentalizada.
A decisão do governo brasileiro, justificada pela suposta “adesão displicente” em 2021 sob Bolsonaro e por custos financeiros de €10 mil anuais, parece mais um alinhamento ideológico com o bloco do Sul — que frequentemente adota posturas anti-Israel — do que uma defesa da soberania ou justiça.
Essa escolha isola o Brasil de valores compartilhados por democracias ocidentais e enfraquece sua posição como mediador global.
Por um Brasil soberano e justo.
Um Brasil verdadeiramente soberano não se curva a pressões externas, sejam elas dos Estados Unidos ou do bloco do Sul. Soberania não significa alinhamento automático com qualquer grupo, mas a capacidade de defender o que é justo com coerência e imparcialidade.
O Brasil deve criticar violações de direitos humanos globalmente — seja em Gaza, na Ucrânia ou em qualquer outro conflito — sem abandonar compromissos com a memória histórica ou ceder a narrativas que alimentam o ódio.
Sair da IHRA e alinhar-se a ações que podem ser percebidas como unilaterais não fortalece a soberania, mas transforma o Brasil em um lacaio de agendas alheias, comprometendo sua credibilidade internacional.
A decisão de deixar a IHRA é um equívoco que não apenas enfraquece o combate ao antissemitismo, mas também distancia o Brasil de sua tradição de equilíbrio diplomático.
É hora de o governo reconsiderar suas prioridades, reafirmando um compromisso com a justiça global, a memória histórica e a luta contra todas as formas de intolerância, sem cair em polarizações que ressuscitam os “tempos de guerra fria” e apenas aprofundam divisões.